Residente de fisioterapia apresenta estudo sobre funcionalidade de pacientes Covid-19

Um grupo de pacientes do Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe) que foram internados em 2020 por Covid-19 tiveram suas vidas entrelaçadas. Todos passaram por uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para vencerem a doença. A experiência deles deu base para a pesquisa Nível de Funcionalidade de pacientes com Covid-19 internados em um hospital universitário do Rio de Janeiro: uma série de casos. O estudo compõe o Trabalho de Conclusão de Residência (TCR) do fisioterapeuta Cleiton Ferreira dos Santos apresentado no final de fevereiro. O objetivo foi avaliar o grau de força muscular e o nível de funcionalidade dos pacientes com Covid-19 e sua evolução. A análise é um parâmetro que justifica também a adoção de clínicas como a enfermaria Pós-Covid do Hupe, que é uma iniciativa pioneira no estado.

Cleiton Ferreira: “Olhar global sobre o paciente”

Cleiton explica que foram avaliados nove pacientes do Hupe entre 41 e 65 anos em dois momentos: na alta da UTI e na própria alta hospitalar. Para isso o fisioterapeuta adotou o tipo de estudo de série de casos, onde foi analisado um grupo específico de pacientes a partir da avaliação clínica e consulta de prontuários. Cleiton conta que usou o índice de Barthel modificado como instrumento de avaliação, que consiste numa escala que possui uma pontuação de 0 a 100; quando maior a pontuação, mais independente esse paciente é. São avaliadas 10 atividades da vida diária (AVDs), o que envolve mobilidade, locomoção e capacidade para executar tarefas da vida diária. “Só inclui no meu estudo pacientes que antes da internação tinham independência prévia, ou seja, eles tinham 100 pontos no índice de Barthel. O que significa que antes da Covid-19, eles tinham domínio total das suas atividades de rotina e no processo de hospitalização tiveram um declínio funcional”, explica. O estudo mostrou que dos nove pacientes internados, quatro receberam alta da UTI com dependência total, dois pacientes com dependência grave, dois com dependência moderada e apenas um paciente manteve seu nível independência. No dia da alta hospitalar, a maioria deles apresentou melhora nesse índice de função.

FRAQUEZA MUSCULAR  – O levantamento de Cleiton também avaliou a força muscular periférica, medida pelo escore Medical Research Council (MRC), que pontua de 0 a 60, quando maior a pontuação, mais força o paciente apresenta.  No estudo, dois pacientes saíram da UTI com uma fraqueza muscular grave, ou seja, menos que 36 pontos nesta avaliação de força e três pacientes com fraqueza muscular significativa, ou seja com pontuação menor que 48.  Porém o estudo mostrou que da enfermaria até a alta hospitalar, seis pacientes receberam alta hospitalar com força muscular preservada, 60 pontos. O estudo fez um paralelo com a literatura e listou fatores que justificam esta fraqueza. “Tempo de ventilação mecânica, imobilidade no leito, uso de drogas  vasoativas, sedativos, bloqueadores neuromusculares… Tudo isso pode gerar esta fraqueza e fazer com que o paciente dependa de alguém para fazer suas atividades”, justifica.

A partir destas observações, o fisioterapeuta definiu o ponto de chegada do estudo. “Conclui que, conforme está bem consolidado na literatura, a mobilização precoce que se inicia na UTI deve ser continuada até à enfermaria, sendo fundamental para o ganho da força muscular e nível de função dos pacientes que, assim sairão melhores na alta hospitalar”, destaca Cleiton.

A equipe de fisioterapia do Hupe atuamdiretamente na reabilitação dos pacientes pós-Covid, foco do estudo do fisioterapeuta Cleiton Ferreira.

A intervenção da fisioterapia na recuperação pós-UTI de fato eleva o grau de independência funcional destes pacientes ao comparar com o momento da alta.  Foi o caso de Elenice Ribeiro, 63 anos. Ela passou por 113 dias de internação no Hupe. “Deus fez um grande milagre em minha vida”, declarou. Após passar por longo período de ventilação mecânica e traqueostomia, ela foi transferida para a Enfermaria Pós-Covid onde contou com a atuação diária da equipe de fisioterapeutas com sessões que envolvem exercícios funcionais. Ao receber alta, ainda sem pleno domínio da sua independência, ela foi encaminhada ao serviço de fisioterapia de uma unidade municipal. O que é fundamental para a recuperação de pacientes com quadros pós-Covid.

Para a fisioterapeuta do Hupe Natalia Dias Kreischer, que participou da banca de avaliação do TCR, a avaliação da funcionalidade dos pacientes pós-Covid-19 é bastante relevante. “Isto porque possibilita entender o real quadro destas limitações oriundas da doença e de internações prolongadas”, afirma. A especialista alerta para o cuidado destes pacientes tanto pela necessidade do uso de uma série de medicamentos, quanto pelos danos e seqüelas pulmonares originados pela doença. “Baseado no conceito de OMS preconizando que, associado ao diagnóstico clínico, é importante o conhecimento do nível de funcionalidade do paciente, precisamos avaliar e entender como estamos retornando essas pessoas para a sociedade e, ao mesmo tempo, no período de internação trabalhar para minimizar os danos”, considera Kreischer.

 

RESIDÊNCIA NO HUPE

            Cleiton Ferreira dos Santos atravessou mais de 1.600 km para fazer Residência em Fisioterapia no Hupe. Natural da Bahia, ele escolheu o programa de Residência do Pedro Ernesto para aperfeiçoamento profissional. “Encontrei aqui uma residência muito qualificada. O plano pedagógico para conduzir a residência é excelente. É uma prática baseada em evidências”, definiu.

Para o fisioterapeuta, a especialização o ajudou a ter autonomia e trabalhar em equipe. “Aprendi a não reproduzir simplesmente o que o colega faz, mas sim estar à beira do leito discutindo o porquê daquela conduta e olhar o paciente de forma global. Agradeço muito aos meus preceptores por ter aprendido tanto com eles, destaca o profissional. Ele grifa ainda a questão de ter tido esta oportunidade dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). “A assistência ao paciente é gratuita e apesar das barreiras, é um serviço qualificado e único do nosso país”, destaca.